Alessandro De Carolis, Silvonei José – Cidade do Vaticano
Você pode ser um artesão do sagrado ou amigo de Deus, a chave está em como se vive a oração, o único “exercício” que leva a criatura à intimidade com o Criador. O padre Pietro Bovati, teólogo da Pontifícia Comissão Bíblica e por uma semana pregador do retiro quaresmal da Cúria Romana em Ariccia, abriu neste domingo à tarde o ciclo de meditações traçando o caminho espiritual que seguirá até sexta-feira, 6 de março. “Rota” que o Papa segue da Casa de Santa Marta, como ocorreu para os compromissos dos últimos dias. Neste domingo, na abertura dos Exercícios, o padre Bovati leu as linhas de uma pequena mensagem na qual Francisco, com resfriado, escreve: “Eu os acompanharei daqui”. Vou fazer os Exercícios no meu quarto, seguindo as pregações do padre Bovati, a quem muito agradeço. Rezo por vocês: por favor, rezem por mim”.
A oração, diz e reitera o padre Bovati, é um “caminho”, que segue “traços divinos”, e o emblema deste dinamismo é Moisés. Quando o Patriarca, como narra o livro do Êxodo, vai à tenda do encontro, colocada fora do acampamento, que, sublinha o pregador, “é o caminho do desejo”, de deixar tudo para ir ao encontro com Deus, e a nuvem que desce sobre a tenda à medida que Moisés se aproxima é o sinal do Altíssimo que “vai ao seu encontro”. Isto, observa o padre Bovati, “anula uma ideia bastante difundida que identifica a oração com uma palavra que o homem dirige ao Senhor”, quase uma “forma de recitação”, enquanto “a oração autêntica é, ao contrário, fundamentalmente uma experiência profética, aquela através da qual a criatura humana pode, em silêncio, escutar a voz do Senhor”. É um “face a face” no qual, diz a Bíblia, Deus fala a Moisés “como a um amigo”.
Aqui está um primeiro valor da oração, que tem o que o teólogo jesuíta chama de “prodigiosa familiaridade “.
Aqui, a familiaridade com Deus nada tem a ver com a familiaridade nos assuntos religiosos, nem mesmo com uma boa cultura teológica ou bíblica. Pelo contrário, é fruto exclusivo da oração autêntica, na qual é dado ao homem ver e saborear o plano de amor de Deus, a sua vontade benéfica a ser posta em prática concreta, pronta e generosamente. Sem esta experiência de familiaridade não há vida autenticamente religiosa, mas apenas – na melhor das hipóteses – o ofício das coisas sagradas.
Obviamente esta confidência não é improvisada, “é o ponto final de um processo”. É de certa forma uma transfiguração semelhante à que Moisés viveu através da experiência da sarça. Para alcançar esta intimidade com Deus, afirma o padre Bovati, “é necessário ter repetidas experiências de fogo” e nisto a sarça pode “representar – afirma – a pessoa humana na sua fragilidade, fraqueza e miséria como a de um espinheiro, que no entanto é investido por uma perene força de vida: o fogo”.
Não se trata simplesmente de atualizar um pouco o fervor da nossa alma através de algum exercício apropriado de devoção, mas de assumir com renovado compromisso da verdade, com uma sincera abertura de coração o dom que Jesus veio trazer ao mundo. Quando exclamava: “Eu vim para lançar fogo sobre a terra, e como eu gostaria que já estivesse aceso!
É o fogo que o mundo de hoje necessita constantemente, no qual para o pregador existem “condições de necessidades espirituais urgentes e até dramáticas, que requerem forças espirituais de cura que só Deus pode dispensar”.
A Igreja está sempre desejosa de se renovar espiritualmente, é chamada a um processo de reforma que certamente não pode limitar-se a medidas disciplinares e administrativas, porque o Espírito solicita impulsos e mártires que só os santos podem assumir. O que podemos fazer agora, na consciência da nossa responsabilidade como crentes, é “subir à sala do andar superior”, como narrado nos Atos dos Apóstolos, e em segredo, perseverantes e concordes na oração, esperar humildemente o poder do Espírito Santo que descerá, segundo a promessa, sobre todos aqueles que rezam.
Num percurso meditativo que vai entrelaçar o Livro do Êxodo com o Evangelho de Mateus, assim como a leitura dos Salmos, o último “ícone” que o padre Bovati indica é o de Moisés tirando as sandálias ao aproximar-se da sarça ardente. É a pausa diante do divino é o convite “a parar, a não distrair o coração com outros pensamentos”, mas concentrar no encontro com Deus “todas as energias do coração”.
Fonte: Acidigital