Nesta sexta-feira, 25 de outubro, será entregue aos padres sinodais a redação final do documento do Sínodo para Amazônia com todas as contribuições debatidas e propostas sistematizadas para aprovação no sábado, 26, antes de ser encaminhado ao papa Francisco para que possa ajudá-lo a escrever uma exortação pós-sinodal com novos caminhos para Amazônia.
Na live desta quinta-feira no Facebook, 24 de outubro, o jornalista Silvonei José da Rádio Vaticano conversou com o bispo de Roraima e segundo vice-presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Mário Antônio da Silva, que explicou como funciona essa reta final do sínodo, falou sobre a situação dos migrantes venezuelanos e que o Sínodo Pan-Amazônico dá esperança para evangelização, para a Igreja e para uma ecologia integral.
Leia a transcrição da entrevista na íntegra:
Silvonei José: Nós estamos na fase da redação do documento final do sínodo, o senhor faz parte desta comissão?
Dom Mário: O Sínodo tem várias etapas e teve a etapa dos inter-eventos de todos os padres sinodais. Teve a etapa de reflexão nos grupos por duas vezes. Nessa segunda vez, os grupos se reuniram para oferecer propostas ao documento final que hoje, quinta-feira, e amanhã será analisado. No final do dia de amanhã, sexta-feira, 25 de outubro, será entregue a todos padres sinodais. São propostas que estão vindo dos grupos à luz daquilo que era o Instrumento Laboris, frutos das reflexões em nossas comunidades. É um processo delicado, de muita responsabilidade. Também de esperança e confiança para que o que vamos entregar ao Papa possa ajudá-lo a escrever uma exortação pós-sinodal realmente com novos caminhos para Amazônia, para evangelização, para a Igreja e para uma ecologia integral.
Sem entrar nos detalhes deste documento, mas a “esperança” é a palavra justa de usarmos neste momento. É um trabalho que está sendo afunilado desde o início. É um caminho longo para chegar a esse documento?
Já na primeira fase muitas contribuições, além dos inter-eventos de cada padre sinodal. Mais de 180/200 pessoas puderam falar quatro minutos. E agora nessa última etapa dos grupos, são 12 grupos, ou seja, são 12 propostas para todo o projeto do documento final. Então, é muito trabalho aí dos peritos, dos relatores e que vamos agora analisar na tarde de hoje, quinta-feira, para dar prosseguimento a esse regulamento, ao esquema sinodal de discussão de consenso e de propostas para o Papa Francisco.
O Sínodo cria uma grande expectativa, gerou polêmicas. O Papa disse no primeiro dia ‘vamos fazer um Sínodo para dentro, transparente para que não haja um sínodo dentro e um sínodo fora’. Alguns jornalistas, meios de comunicação tentam desvirtuar isso dizendo quase de sínodos paralelos. Isso faz mal, não faz?
Na verdade, o processo sinodal tem toda uma dinâmica, que aquilo que vem de fora, de maneira não honesta, não sincera, não colaboradora, causa, digamos assim, más informações não em nós que estamos nas aulas sinodais, nas salas sinodais, mas naqueles que estão nos acompanhando. Então, eu creio que não procede muitas informações que vão contrárias àquilo que nos tem falado o Papa Francisco, àquilo que nos apresentaram as nossas comunidades para esse debate sinodal. É certo que não estamos livres disso, mas o processo sinodal nesta última semana se encaminha de maneira assim muito consistente para que a conclusão dos trabalhos seja realmente digna do merecimento do povo da Amazônia e porque não de toda a nossa Igreja.
Foram tantos os temas tratados pelos senhores e continuam sendo afunilados nesse documento final. Tivemos o tema do “Viri probati”, a questão da presença da mulher muito importante na Amazônia, do diaconato feminino, mas também falou-se de um rito para Amazônia. O que significa esse rito? Já não temos o nosso rito na celebração das nossas Santas Missas?
Das muitas propostas que estamos refletindo em continuidade com aquilo que já comentávamos lá nas nossas bases, surgiram novas propostas devido à necessidade de avanço e de responder ao tema do Sínodo: novos caminhos, e uma das questões que surgiu num dos grupos, agora é temática do projeto do documento final, é o rito amazônico. Como foi pensada essa proposta? É um rito que tem um patrimônio não apenas litúrgico, mas é litúrgico, disciplinar, teológico e espiritual, como são tantos outros ritos na Igreja Católica. É um rito da Igreja Católica. É uma proposta que está em andamento e que está em reflexão, inclusive, os grupos do Brasil que são quatro grupos também refletiram e fizeram propostas a respeito do sim ou do não para a questão do rito amazônico. Então é uma proposta em andamento, é um Sínodo em construção para que aquilo que vá ser definido no sábado, que é a votação final das proposições, realmente seja encaminhado aquilo que é de melhor para Amazônia e de maior consenso entre nós.
São propostas, ninguém está inventando nada. São propostas e é uma questão muito séria. O rito litúrgico é muito sério.
Muito séria e de muita responsabilidade tanto que não se implanta da noite para o dia, não se pensa da noite para o dia. Caso seja algo de consenso entre nós tem todo um procedimento, todo um encaminhamento junto à Santa Sé e junto aos órgãos competentes. Uma coisa é clara: com o novo rito amazônico ou não, não deixamos de ser católicos, não deixamos de apoiar e seguir as nossas comunidades na Amazônia. Sejam as comunidades dos povos originários, tradicionais, indígenas, ribeirinhos, das imensas e pequenas cidades. Tudo isso será pensado para que haja ainda entre nós mais harmonia e mais comunhão.
No pacto das catacumbas com olhar amazônico, um momento muito intenso, eu estive lá e posso garantir que foi um momento muito intenso, as críticas que vêm é que o pacto poderia ter substituído o documento final do sínodo. O senhor poderia explicar o pacto e porque se fazer um pacto?
O pacto das catacumbas a gente sabe pela história dos bispos que realizaram na época como quase na conclusão do Concílio Vaticano II e de compromisso. É de compromisso com os pobres e nós bispos da Amazônia e demais pessoas que estiveram conosco fizemos então a recordação, a memória deste fato lá da época do Concílio e também fizemos nosso Pacto pela Casa Comum. Um pacto que tem como compromisso de ser uma igreja profética, samaritana, de ser uma Igreja solidária. De ser uma Igreja, realmente, cada vez mais do Reino de Deus. O que era o coração da pregação para Jesus, de sua vivência, o Reino de Deus. E o coração para o reino de Deus são os pobres, aqueles que são mais ameaçados. Então, o pacto é trazer para nós essa memória, esse compromisso, essa responsabilidade de desempenhar a nossa missão à luz do Reino de Deus com prioridade àqueles que estão mais ameaçados na Amazônia, no Brasil e no mundo. Não tem nada de paralelo, é um desdobramento da nossa fé, do nosso compromisso que nós realizaríamos. Isso antes, durante ou depois do Sínodo sem nenhuma alteração naquilo que é realmente o nosso compromisso e o nosso ministério.
O senhor na sua diocese acolheu milhares de imigrantes da Venezuela. Qual é a situação nesse momento e qual a a resposta que a Igreja está dando a essa situação?
A questão migratória Venezuela – Brasil começou em 2015/ 2016, se intensificou em 2017/2018 e continua em 2019. A dramática crise humanitária no país venezuelano força muitos a irem para outros países na América Latina e até mesmo na Europa e também no Brasil, como estamos vivenciando lá em Roraima. Consideramos que a migração é um direito, por isso, tentamos nos nossos limites e nas nossas possibilidades acolher esses novos irmãos e irmãs, promover e, como nos pede o papa Francisco, também integrar nas nossas comunidades e integrar nas demais comunidades do Brasil. Tem esforços da diocese com apoio da CNBB, com apoio das congregações religiosas, com apoio da Cáritas brasileira e Cáritas diocesanas para que esse trabalho se desenvolva, como também tem o esforço do Governo Federal nessa acolhida e interiorização. Por isso, é necessário que o Brasil todo, além de Roraima, que é nosso compromisso primeiro, acolha esses irmãos migrantes e refugiados. Acolher famílias inteiras, acolher grupo de pessoas, muitos têm feito essa experiência e tem dado uma lição de solidariedade muito bonita. E eu creio que o Brasil consegue acolher não todos que estão em Roraima, cerca de 10% da nossa população, de 50 a 60 mil venezuelanos em todo o nosso estado e o Brasil tem condições, possibilidade de acolher com o apoio do Governo Federal, com atividades integradas entre o Governo Federal, Estadual e Municipal e também com a participação de nossas Igrejas, dioceses, congregações, paróquias e comunidades para que esses nossos irmãos vindos da Venezuela sejam acolhidos e possam ter uma vida de felicidades, de esperança juntamente conosco. Eles não querem ocupar nossos espaços, mas precisam nesse momento conviver conosco.
É a mão estendida?
É a mão estendida, o coração aberto, o olhar atento porque ninguém de nós é imune à tal necessidade. É hora do Brasil e demais países da América Latina serem solidários com esses irmãos do nosso continente.
Na próxima semana a nova presidência da CNBB que foi eleita este ano será recebida pelo papa Francisco.
Nossa presidência, dom Walmor, dom Jaime, dom Joel e eu estaremos aí visitando algumas Congregações aqui no Vaticano e a nossa convivência se concluirá com uma audiência com o nosso querido Papa Francisco. Momento importante não só para nós da presidência, mas em comunhão com o episcopado brasileiro com todas as nossas comunidades católicas. É um momento de comunhão e de trazer ao Papa Francisco os frutos da missão da nossa Igreja, das nossas comunidades aqui na conversa com ele. Vamos também colocar a realidade do nosso Brasil, os desafios e dramas que ele já está tomando conhecimento através desse Sínodo, mas de maneira mais ampla de todo o nosso país, bem como as alegrias que temos vivenciado na missão com todos vocês que aí estão em sintonia conosco.
Aguardamos agora os trabalhos finais que vão se concluir com o texto final do documento. Porque a sinodalidade, esse caminhar juntos, foi uma realidade nessas três semanas.
Agradeço de coração vocês que estão aí em comunhão conosco pelo êxito desse processo sinodal. Sabemos que o processo sinodal não termina no próximo domingo, pelo contrário, ele avança cada vez mais, por isso, nosso compromisso pós-sinodal é realmente de sinodalidade, de prosseguirmos juntos pela Amazônia, juntos pelo bem, salvação, santidade, de todos nós na Amazônia, no Brasil e no mundo todo. Gratidão e esperança.
Fonto: CNBB