Abrindo o ciclo de conferências da 33ª edição do Curso para os Bispos do Brasil, que trabalha com a temática Antropologia integral e a crise da cultura atual, o prefeito do Dicastério para a cultura e a educação, Cardeal José Tolentino Mendonça, apresentou nesta manhã de terça-feira (23), para um auditório repleto de bispos de todo o Brasil, a conferência Mudança de época: crise e oportunidade para o Evangelho.
Eduardo Silva – Arquidiocese do Rio de Janeiro
O cardeal iniciou a primeira das suas duas conferências nesta edição do curso chamando atenção para a diferença entre tecnologia e tecnocracia. Enquanto aquela seria um exercício humano da técnica guiado ainda pelo conhecimento científico, esta seria o poder que a tecnologia hoje exerce sobre o Ser Humano e onde conhecimento científico não é só o motor externo do desenvolvimento técnico, mas torna-se uma função intrínseca da própria tecnologia.
A partir dessas definições, dom José Tolentino desenvolveu uma intensa reflexão acerca da metamorfose progressiva da condição humana que, no mundo contemporâneo, a partir da evolução científica, se mistura com as máquinas e com os mecanismos da tecnologia da informação.
33ª edição do Curso para os Bispos do Brasil
33ª edição do Curso para os Bispos do Brasil
“No horizonte do transhumanismo”, destacou dom Tolentino, “pela primeira vez na história da humanidade, a biologia passa a interagir intimamente com a tecnologia, propondo-se como um corretor da biografia humana. O transhumanismo pretende ser uma versão melhorada do corpo humano introduzindo ajudas que já não são externas, mas internas. O ser humano renuncia a ser o seu próprio corpo limitando-se a ter um corpo.”
33ª edição do Curso para os Bispos do Brasil
33ª edição do Curso para os Bispos do Brasil
Diante do surgimento de novas tecnologias, como a Inteligência Artificial, e do uso imoral que delas pode ser feito, o cardeal recordou o antídoto da “promoção do pensamento crítico” indicado pelo Papa Francisco. “O sentido ‘crítico’ é constitutivo da fé cristã”, recordou o prelado. “Na verdade, a crise reside no cromossoma do Cristianismo. Foi – já há dois mil anos – não apenas um espectador, mas a causa do declínio do mundo antigo: a primeira grande mudança de época que o próprio Cristianismo começou. A partir desse momento, a crise nunca mais deixou de acompanhá-lo, desencadeando uma sucessão de outonos e primaveras. A fé pode entrar em crise, certamente. A era da secularização grita isso sem muita cerimónia. Mas também a fé cristã deve constituir uma causa de crise, e questionar e transformar continuamente os sistemas sociais e culturais onde vive. Se não provoca crise, isto é, se não leva ao discernimento evangélico da realidade, desacelera, e deixa de testemunhar a fala do que está sentado sobre o trono: «Eis que faço novas todas as coisas» (Ap 21:5).”
Se já não vivemos mais numa era de fé homogênea, destaca o cardeal, também já não estamos mais no tempo em que o ateísmo parecia reclamar uma espécie de superioridade cultural. Nesse mundo de possibilidades a redescobrir, será missão da Igreja “privilegiar o exercício do diálogo.”
Fotos: Bruno Carvalho